quinta-feira, 14 de abril de 2016

Posição dos Contratos Agrários no ordenamento jurídico: dicotomia - Direito Público e Direito Privado

2.2 Posição dos Contratos Agrários no ordenamento jurídico: dicotomia - Direito Público e Direito Privado

Podemos dizer que a temática Contratos Agrários constitui-se num instituto autônomo do Direito Agrário, de modo que também poderá constituir-se numa disciplina autônoma, se assim quiséssemos aprofundar a pesquisa. Prova disso, prendemo-nos no fato de que eles têm destaque no Estatuto da Terra no CAPÍTULO IV “Do Uso ou da Posse Temporária da Terrae encontram-se regulamentados no Decreto 59.566/66 formando um micro-sistema legislativo.

Muito embora, o direito, como um todo, possa ser considerado como uma unidade indivisível e o estudo dos contratos agrários dependente de conceitos e regras ditadas por outros institutos jurídicos – numa visão integrativa do direito para que não haja lacunas, o certo é que os contratos agrários formam um corpo legislativo próprio. Com isso, ao regular os fatos ocorridos em seu campo de atuação, procurando uma solução ou resposta adequada, ganha autonomia.

Ressalte-se, mesmo estando caracterizado como autônomo, em caso de ausência ou lacuna no seu âmbito disciplinar para regular determinada conduta, a solução deverá ser buscada dentro do próprio sistema jurídico, ou seja, o “direito” como um todo. Como ocorre com as demais disciplinas, direito comercial, civil, tributário etc.

Portanto, esse sistema legislativo que regulamentou os contratos agrários, forma uma disciplina, salvo melhor juízo de quem assim não pensa. Desse modo, se a assertiva nos leva a afirmarmos de que efetivamente forma uma disciplina, então devemos conhecer seu ramo de atuação no mundo jurídico, se pertencente ao Direito Público ou Privado.

Vejamos. Os Contratos Agrários estão posicionados, por carregarem traços de aproximação conceitual, no limiar da definição daquilo que em institutos similares pertenceria ao Direito Público.  Mas para se diferenciar desse modelo unívoco, também contém parte da gênese do Estado Liberal classificado e compreendido como Direito Privado em que impera a liberdade das partes. Essas duas faces decorrem do fato de que naquele o Estado tem um nítido interesse intervindo fortemente na relação contratual através de normas cogentes, inibindo a ampla liberdade das partes, em prol do interesse coletivo, na busca da eqüidade. Por outro lado, os contratos agrários também não se separam dos conceitos de direito privado, posto caracterizarem dentro do Estatuto da Terra clara relação de negócio que permite explorar o capital (propriedade da terra) para obter rendas. Nesse caso, trata-se da mais notória visão capitalista que sempre esteve presente nas civilizações e que ainda continua atual: o dogma capital versus trabalho.

Ad argumentandum, os Contratos Agrários, enquanto fulcrados na liberdade de o proprietário dispor do seu bem imóvel, ainda que temporariamente, qualifica-se, dentro dessa ótica, como atividade típica da iniciativa privada. No dizer de Eduardo Lorenzetti Marques[1]: “O conceito de negócio jurídico possui base ideológica no Estado Liberal, cuja característica essencial é a preservação da liberdade do indivíduo em face do Estado. Por conseguinte concebeu-se o negócio jurídico como o maior instrumento de realização da vontade individual, tudo isso por meio da liberdade contratual que, em princípio, era querida sem limites”.

 Contemporaneamente, os contratos agrários são limitados pelo evidente interesse do Estado nessas relações individuais em prol do homem campesino. O Trabalhador Rural freqüentemente encontra-se desprovido de fortuna, bens e capital, tendo como eficazes instrumentos os seus braços para o trabalho, empregando a força e a resistência do corpo. Contudo muitos deles sem a posse da terra para o exercício da profissão que lhes seria natural. De outra parte, outros, titulados donos da terra, dela se servem como capital para obter rendas. Alguns donos/proprietários vão mais além ao simularem um pacto negocial, objetivando sonegar uma verdadeira relação de emprego com o trabalhador campesino. Esse equilíbrio entre a propriedade e o trabalho é que se pretende alcançar através do uso temporário da terra, protegido normativamente, em prol da eqüidade no campo.

Poderíamos então, dizer que os contratos agrários estariam inseridos no ramo do direito privado naquilo que vierem regular os interesses nas relações entre as partes, assegurando a fruição de seus bens. Por outro lado, se inserem também no Direito Público, na parte em que a legislação objetiva regular os interesse do Estado e da sociedade, uma vez que, vias de regra, existem interesses das partes os quais devem ser equilibrados em prol dos contratados arrendatários e parceiros, por vezes fragilizados, resguardando desse modo o interesse geral da sociedade.

Podemos também dizer que os não proprietários geralmente são considerados pelas normas agrárias como hipossuficientes.

Em conclusão, há de se afirmar que os contratos agrários não pertencem de forma plena ao ramo do Direito Público nem ao Privado, mas deles se utilizam ou se incluem de modo mitigado ou sui generes, podendo causar inúmeras discussões doutrinárias quanto a essa classificação.




[1]              Marques, Eduardo Lorenzetti. Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: LTR, 1999, p. 177.

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